Reportagem: Carolina Fioratti
Fotos: André Ricoy
Nesta quinta (16), o Instituto Butantan celebra a primeira década da Plataforma Zebrafish – iniciativa que utiliza o peixe paulistinha (Danio rerio) em pesquisas do setor de neurociência, farmacologia, toxicologia e biomedicina. O espaço, localizado no Laboratório de Toxinologia do Butantan (LETA), é aberto ao público mediante agendamento e tem como um de seus pilares a divulgação científica para o público leigo, com foco em crianças e adolescentes.
Desde seu lançamento, em outubro de 2015, a plataforma motivou a publicação de 30 artigos, a realização de cinco exposições e permitiu a criação de cinco projetos, incluindo o Paulistinha chega às escolas, que leva os cientistas do Butantan a instituições de ensino, promovendo troca de experiências entre pesquisadores e estudantes. Além disso, foram lançados seis livros com foco em divulgação científica, e que são utilizados nas atividades promovidas pelo laboratório: Paulistinha chega às Escolas; Paulistinha chega às Escolas: Livro do Professor; Oficina Zebrafish para Professores: Relação entre o zebrafish e o humano; Na Onda da Ciência; Um dia na Plataforma Zebrafish (gibi); e Zebrafish em Figurinhas: Protegendo o Meio Ambiente.
Agora, a plataforma promove o lançamento do livro Zebrafish: análise comportamental como uma poderosa ferramenta. Diferente das anteriores, a nova obra tem caráter mais técnico e visa a capacitação de cientistas que planejam trabalhar com o paulistinha no País.
Segundo Mônica Ferreira Lopes, coordenadora da Plataforma Zebrafish e pesquisadora científica do LETA, o livro consolida-se como o primeiro manual com foco na análise comportamental do peixe a ser publicado no Brasil. “É muito importante realizar estudos comportamentais pois eles geram diversas respostas, seja para a exploração sobre o sistema nervoso central, seja para a realização de um teste de toxicidade, ou mesmo para a avaliação de segurança de um fármaco. É um guia que estávamos precisando na pesquisa.”
O livro não será comercializado, mas poderá ser acessado por meio da Biblioteca Científica do Instituto Butantan (biblioteca.atendimento@butantan.gov.br), que guardará a versão física e o conteúdo em PDF no Repositório Institucional. As outras obras e artigos escritos pela equipe do Zebrafish podem ser encontrados da mesma maneira.
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Mônica planeja ainda lançar um segundo livro com foco em cientistas no primeiro semestre de 2026, trazendo em suas páginas técnicas de criação e manejo – tema essencial considerando o aumento dos trabalhos envolvendo o paulistinha. Desde 2021, foram publicados anualmente cerca de 4.500 artigos citando o Zebrafish em todo o mundo.
A preocupação com a educação de pesquisadores não é uma novidade para a plataforma. Desde 2015, foram realizados 19 cursos de capacitação envolvendo o Zebrafish, três deles neste ano. Mônica estima que mais de mil pessoas já tenham passado pelas aulas promovidas no laboratório.
“O Zebrafish nasceu com três objetivos: fazer pesquisa na área de imunologia, toxinologia; promover o ensino, porque quando nós começamos vimos as dificuldades e facilidades enfrentadas, então foquei também em transmitir o conhecimento sobre criação e manejo, biologia molecular e testes de comportamento; e realizar a divulgação científica, usando a plataforma como ferramenta para chegar na sociedade. É isso o que a gente vem desenvolvendo nesses últimos 10 anos”, relata Mônica.
Equipe da Plataforma Zebrafish reunida em comemoração ao aniversário de 10 anos
O peixe paulistinha começou a ser pesquisado no Butantan em 2015 por meio do Centro de Pesquisa em Toxinas, Resposta-Imune e Sinalização Celular (CeTICS), um Centro de Pesquisa, Inovação e Difusão (CEPID) financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP). Na época, especialistas do Instituto enxergaram potencial no uso do Zebrafish como modelo experimental e foram a outras instituições de referência, nacionais e internacionais, para estudar a sua implementação.
Dentre as principais dificuldades em iniciar o biotério, Mônica relata a criação do ambiente e
o manejo da espécie, processo que levou cerca de dois anos para ser conquistado. “A criação reflete o sucesso da sua pesquisa e tudo que será feito posteriormente. Manter um biotério com qualidade é um desafio diário.”
Hoje, a equipe do LETA domina o manejo do Zebrafish, mantendo os mais de 6 mil peixes adultos e juvenis em condições salubres e alinhadas à ética animal. O projeto conta com seis servidores e colaboradores do Butantan, três pós-doutorandos e posições rotativas preenchidas por alunos de iniciação científica, mestrado, doutorado e estágio obrigatório.
“Eu só desejo à plataforma uma vida longa, com a minha presença ou não. Desejo que ela vá subindo cada vez mais um degrauzinho, e sempre abraçada pelo Butantan. Saber que hoje essa plataforma é uma referência e que o Instituto se tornou uma referência em Zebrafish me deixa feliz.”
Há diversos pontos que tornam o Zebrafish atraente para a pesquisa. Para começar, ele tem um baixo custo de criação quando comparado a outros modelos experimentais. Além disso, a espécie não costuma passar dos 3,5 cm de comprimento, o que facilita sua manutenção em espaços menores. Outra vantagem está no acasalamento do peixe, que gera entre 200 e 300 embriões – principal fase de desenvolvimento utilizada na pesquisa.
A reprodução do Zebrafish ocorre de forma externa, gerando embriões transparentes. Tal fato permite um maior acompanhamento por parte dos pesquisadores, que podem aproveitar esse momento germinativo para colocar compostos em contato com o peixe. Esses materiais são absorvidos pelo embrião sem necessidade de injeção ou outros tipos de manipulação, minimizando o estresse animal.
Há ainda vantagens genéticas: os genes do Zebrafish e dos humanos apresentam uma similaridade de 70%, ou seja, é possível que aquilo observado nos peixes se repita para as pessoas. O sistema imune do animal também apresenta correspondências com o humano, assim como seus olhos e coração. Dessa forma, os cientistas podem ter o paulistinha como aliado na busca por tratamento para problemas como glaucoma, retinopatia, doenças cardíacas e até mesmo o câncer.
A Plataforma Zebrafish pode ser visitada por pesquisadores, escolas e grupos interessados no tema por meio de agendamento pelo e-mail plataforma.zebrafish@butantan.gov.br