Portal do Butantan

A Dona Aranha subiu pela parede: a ciência por trás da cantiga popular

Será que aranha consegue escalar paredes, aguenta uma chuva forte e prefere o calor? Cientista do Butantan desvenda a música do ponto de vista científico


Publicado em: 16/05/2025

Reportagem: Camila Neumam
Ilustrações: Lorena Weinketz

A saga da aranha persistente que não desiste de subir uma parede, mesmo sendo derrubada pela chuva, marcou a infância de muita gente. Ela é contada na memorável canção infantil “Dona Aranha”, muito conhecida no Brasil e em vários países – tanto que há versões em diferentes idiomas. 

A cantiga como conhecemos hoje foi descrita em livros de músicas folclóricas dos Estados Unidos da década de 1940. Com o título “Itsy Bitsy Spider” (“Pequena aranha”, em tradução livre), ela conta a história de uma aranha sendo derrubada pela chuva ao tentar subir por um encanamento. Quando o sol aparece e seca a água da chuva, ela tenta novamente. 

A versão inglesa e australiana ganhou o nome “Incy Wincy Spider”, mas têm a mesma letra e tradução. Bem parecida com a versão em português, não é mesmo? (Veja a letra abaixo)

 

Há, porém, indícios de que a música já era conhecida por falantes da língua inglesa muito antes. Em 1910, o escritor norte-americano Arthur Walbridge (1874-1943) fala em seu diário de viagem da canção “Spider Song” (“Música da Aranha”, em tradução livre), cuja letra é bem parecida com a “Pequena Aranha”. No diário, que foi publicado depois com o título “Camp and Camino in Lower California” (algo como “Acampamento e Caminho na Baixa Califórnia”), o autor conta que escreveu a canção, que ele chama de “um clássico”, para duas crianças que encontrou no México. 

Para além da história da canção, você já se questionou qual a função das aranhas na natureza? Se elas podem realmente escalar paredes e se a chuva as derruba facilmente? O Portal do Butantan consultou a bióloga e pesquisadora científica do Laboratório de Bioquímica do Instituto Butantan Adriana Rios Lopes para responder essas e outras perguntas.

 

1.    Qual a função das aranhas na natureza?

Assim como todos os seres vivos, as aranhas são extremamente importantes para a manutenção do equilíbrio na Terra e para a preservação da biodiversidade. Elas também são usadas como controle biológico de pragas porque comem insetos – podem até mesmo ajudar a diminuir a quantidade de mosquitos em casa, inclusive do Aedes aegypti, transmissor da dengue, zika e chikungunya. 

As aranhas também são objeto de estudos que envolvem desde a criação de materiais mais resistentes, até a busca por novos medicamentos. O veneno é investigado como possível remédio contra doenças do coração, por exemplo. Quanto à tecnologia adotada na construção das teias de aranhas, ela já é usada pelas indústrias japonesa e alemã que a utiliza para fazer testes de resistência de materiais, e na pesquisa e desenvolvimento de curativos biológicos, que aderem à pele, para evitar o uso de tecidos artificiais no futuro.

 


 

2.    As aranhas conseguem escalar paredes?

Sim, as aranhas conseguem escalar paredes em várias situações e podem fazer isso com ou sem a ajuda da teia. No geral, as aranhas sobem ou descem paredes na busca por alimentos, quando abandonam a teia em caso de perigo ou quando estão procurando por outro lugar para fazer seu refúgio. Algumas curiosidades sobre o refúgio das aranhas: algumas espécies que vivem nas cidades tendem a fazer suas teias no telhado ou no teto das casas porque são locais onde há mais insetos e, assim, elas garantem a comida. Além disso, estes locais são mais protegidos da ação da natureza e humana – afinal, não é todo dia que se limpam calhas e os cantinhos da parede.

Em áreas com vegetação, algumas espécies fazem teias imensas entre arbustos. Um exemplo é a aranha-de-teia-amarela que tece fios dourados que, em dias ensolarados, ganham um brilho especial.


 

3.    A chuva pode derrubar uma aranha?

A grande maioria das aranhas constrói suas teias em locais cobertos, justamente para evitar serem derrubadas por ventos fortes ou pela chuva. As que constroem suas teias em locais abertos se preparam para o tempo ruim construindo tocas – emaranhados de teias, que parecem umas bolinhas de lã, onde as aranhas ficam mais protegidas. 

As teias são proporcionalmente fortes, mas podem se romper durante vendavais, chuvas fortes ou pelo toque humano (afinal, seus fios são bem fininhos!). Se o aracnídeo estiver na teia quando isso acontecer, a chance de sobrevivência diminui. Quando eles conseguem fugir, andam até chegar a um local seco para poder construir novamente a teia e, assim, conseguir se alimentar – a teia serve não só de abrigo para a aranha, mas também de armadilha para as presas.


 

4.    A aranha vive melhor em ambientes quentes ou frios?

Há aranhas em todos os continentes do planeta, o que mostra que inúmeras espécies se adaptam a temperaturas diversas. Algumas espécies de  aranhas se recolhem no inverno para locais mais protegidos, mas são animais que se adaptam bem a diferentes temperaturas. Nos países tropicais, como o Brasil, as fêmeas se recolhem durante o inverno para cuidar de suas ootecas (o conjunto de seus ovos encobertos por uma grossa camada de teia). As fêmeas passam esse período integralmente protegendo os ovos, sem sequer comer, e os ovos eclodem naturalmente. 

 

 

5.    Podemos dizer que as aranhas são persistentes (teimosas)?

As aranhas são exemplos de animais que não desistem de ter um cantinho para chamar de seu. Mesmo quando sua teia é destruída ou abandonada, ela trata de achar um outro lugar para começar tudo de novo. E olha que tecer uma nova teia requer muita energia. Isso porque a teia de aranha é líquida e se solidifica em contato com o ar. A estrutura e a durabilidade das teias de aranha são tão complexas que a ciência não se cansa de estudá-las. 

 

 

 

DONA ARANHA
A Dona Aranha subiu pela parede
Veio a chuva forte e a derrubou
Já passou a chuva
O sol já vai surgindo
E a dona aranha continua a subir
Ela é teimosa e desobediente
Sobe, sobe, sobe e nunca está contente.
A Dona Aranha desceu pela parede
Veio a chuva forte e a derrubou
Já passou a chuva
O sol já vai surgindo
E a dona aranha continua a descer
Ela é teimosa e desobediente
Desce, desce, desce e nunca está contente.
A Dona Aranha subiu pela parede
Veio a chuva forte e a derrubou
Já passou a chuva
O sol já vai surgindo
E a dona aranha continua a subir
Ela é teimosa e desobediente
Sobe, sobe, sobe e nunca está contente.

 

Fontes: 
Camp and Camino in Lower California (Arthur Walbridge)
Library of Congress
Biblioteca Digital Butantan
Portal do Butantan